Atual cenário trabalhista: disrupção, inovações na lei, inteligência artificial e novas identidades laborais


14 de janeiro de 2020 – Destaque – Autor: Simony Braga

Pensar o Direito do Trabalho com a visão varguista é anacrônico. Tudo mudou. A Quarta Revolução, também chamada de Revolução Informacional, marcada por sua tecnologia disruptiva, gera impactos significativos no ambiente de trabalho, atribuindo-lhe contornos transnacionais que em nada se assemelham ao antigo modelo herdado da Revolução Industrial.

O dinamismo da Era Informacional impõe ao mercado de trabalho a necessidade de buscar profissionais altamente especializados, que desenvolvam competências humanas não substituíveis pela máquina, porém que operem em sintonia com a tecnologia. O que se deseja é a entrega de um serviço de alta qualidade, com eficiência e agilidade, aliando competências humanas ao (bom) uso da inteligência artificial, não esquecendo das soft skills.

Nesse ambiente disruptivo, marcado pelo compartilhamento e inovação, a estrutura convencional de trabalho é, por vezes, dispensada. A distância geográfica não se apresenta como obstáculo; trabalhadores têm a possibilidade de prestar serviços a empresas sediadas em qualquer lugar do mundo, de forma remota. Há, ainda, uma forte tendência à pluralidade de empregadores: um único profissional prestando serviços a diversas empresas, por opção, não raras vezes, do profissional. Vivencia-se, assim, uma completa quebra de paradigma com o que se presenciou no nascimento da tradicional norma trabalhista, na década de 40.

Surgem, assim, novas profissões, novos formatos de prestação de serviços e modelos de contratação. A utilização de plataformas digitais, a implementação de ambientes compartilhados de trabalho e o uso de inteligência artificial são realidades para pequenas e grandes corporações. Não há escolha: para o negócio manter-se vivo e competitivo, a inovação deve ocupar espaço de destaque na estratégia.

O Brasil não está alheio a esse processo de modernização. Em outubro do ano de 2017, foi implementada a Reforma Trabalhista, através da lei 13.467/17, que trouxe mais de cem alterações à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), visando, sobretudo, flexibilizar a legislação, incentivar a negociação entre os integrantes da relação laboral e reduzir a judicialização de conflitos.

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Em setembro de 2019, a equipe econômica de governo criou o Grupo de Altos Estudos Trabalhistas (GAET), sob a coordenação de um ministro do Tribunal Superior do Trabalho, e de uma juíza do Trabalho, com o propósito de discutir flexibilização e simplificação das normas trabalhistas, visando, sobretudo, a desjudicialização. O Brasil ainda se destaca no rol de países com alto índice de conflitos judiciais trabalhistas. Esta é uma das travas ao crescimento econômico.

Novas modalidades contratuais foram implementadas nesse processo, com estruturas mais dinâmicas e aderentes à realidade produtiva, a exemplo do Trabalho Intermitente, que possibilita a contratação por demanda e tende a fomentar substancialmente a empregabilidade.

Tal modalidade requer regulamentação específica a fim de conferir segurança jurídica à sua aplicação, visto que diversos temas sobre intermitência ainda não foram esclarecidos, a exemplo da (im)possibilidade de se utilizar essa modalidade em atividade regular prevista em quadro permanente da empresa. Recentemente, o TST declarou a validade da modalidade em atividade permanente do quadro, conforme decidido em processo movido contra uma grande rede varejista.

As inovações foram oportunas. Isso porque favorecem o crescimento do ambiente negocial amplamente utilizado nas demais esferas do ordenamento jurídico brasileiro e amenizam a visão, sobretudo dos investidores estrangeiros, de que os trabalhadores brasileiros têm perfil litigante.

A implementação de regramentos na CLT acerca do Teletrabalho merece destaque especial nesse processo. Referida modalidade de prestação de serviços, em que o empregado presta serviços preponderantemente fora das dependências da empresa, com a utilização de tecnologias de informação e comunicação, tem sido cada vez mais utilizada pelas empresas.

Em todos os ambientes, físico ou virtual, o empregador deve seguir as regras contratualmente estabelecidas para a relação de trabalho. Isso significa que regras de boa convivência, respeito e cordialidade devem ser preservadas.

Dada a sua popularidade, o WhatsApp no ambiente corporativo, e a sua inegável contribuição à velocidade das comunicações, é uma eficiente ferramenta de trabalho. Tem-se, certamente, mais ganhos do que perdas em sua utilização. Há de se implementar políticas internas que regulem o seu uso, com regras bem estabelecidas, inclusive com a possibilidade de se aplicar sanções disciplinares ao colaborador que viole as normas internas da empresa neste particular.

Sob essa ótica, oportuno salientar a pertinência da proteção das informações confidenciais no uso de plataformas digitais nas empresas. Apesar de a divulgação não autorizada de informações ser proibida, mostra-se oportuno adotar regramento claro a seu respeito, classificando o que seria informação confidencial seu uso autorizado, a quem pode ser divulgada, para qual finalidade e atos que devem ser praticados caso haja a suspeita de algum vazamento. 

Em conformidade com o perfil de cada corporação, todas as regras acordadas entre contratante e contratado devem ser regidas em documentos próprios da empresa, inclusive em sintonia com o Código de Ética e Conduta e o programa de Compliance.

É inegável: as relações de trabalho vêm passando por alterações significativas, que transcendem as discussões nacionais. Inovação, novas identidades laborais, o uso da inteligência artificial, contextos políticos e socioeconômicos diversos e, ainda, legislações que necessitam adequar-se a toda essa mutação, desafiam os sujeitos da relação laboral a buscarem soluções seguras, flexíveis, equilibradas e aderentes à realidade do mercado de trabalho no Brasil que, a cada momento, deixa emergir novos contornos.

Autora: Simony Braga é sócia responsável pela área trabalhista empresarial do escritório da Fonte, Advogados. Coordenadora do Comitê Jurídico Regional Nordeste, da Associação Brasileira de Franchising (ABF).